Já faz algumas décadas que as mulheres começaram a ganhar o seu espaço. Saíram do território ao qual estavam relegadas e iniciaram a sua caminhada de ocupar os lugares que até um tempo atrás estavam reservados aos homens. Espaços tais como: direito ao trabalho, à liberdade do sufrágio, chefia liderança política, cargos executivos como os de primeiro ministro, presidente da república, etc. Todavia, no meio denominacional batista, as mulheres ainda lutam para ocupar o seu espaço em nível de ministério pastoral. As mulheres batistas têm conduzidos associações, convenções estaduais e têm ocupado a presidência convencional e as diversas instâncias da liderança denominacional, mas ainda lutam pela sua aceitação em termos de reconhecimento do ministério pastoral feminino. Embora este já tenha sido reconhecido por quase uma centena de igrejas batistas que ordenaram suas pastoras entregando-as à denominação batista brasileira, as pastoras batistas almejam seu ingresso na Ordem dos Pastores Batistas do Brasil - OPBB, mesmo que, no ano de 2008, a OPBB já tenha negado o seu ingresso no dito grêmio. Mesmo com as portas (ainda) fechadas, elas continuam a sua luta de ingresso nesta ordem. Os argumentos bíblicos pró ou antipastoras são disponibilizados e discutidos por ambos os lados, mas o impasse é iminente. A pergunta que se levanta é: “É possível que dois grupos que estudam o mesmo texto sagrado mantenham posições diametralmente opostas?” Entende-se que tal divergência vai além de uma questão hermenêutica. É um problema histórico, ideológico-teológico que sobrepuja as regras de interpretação. A OPBB tem em sua formação, pressupostos e conceitos cristalizados, que sua liderança e membros almejam manter. Pode-se entender esta postura, mas ela também pode ser estudada e até questionada num contexto maior da interdisciplinaridade. Algumas questões podem ser levantadas para entender este impasse: 1. Entende-se que a ideologia tem como objetivo encobrir as divisões existentes. Essas divisões são maquiadas por aqueles que têm o poder de direção do grupo. O aparecimento do pastorado feminino tende a indicar uma certa insegurança que o chamado sexo forte parece apresentar diante do crescimento pastoral feminino. O espaço começa a diminuir e o poder pastoral masculino tem a sua contestação. Até agora a figura masculina e sacerdotal do pastor, que existia e ainda existe no imaginário dos membros das igrejas, sofre um desgaste de poder. O comando exercido pelos homens perde o seu espaço por um grupo social que sempre esteve à disposição do ministério pastoral e subordinado a este. Isso gera uma crise que deve ser entendida como a oportunidade de nova caminhada. Grande parte do meio batista ainda não consegue desassociar a figura de poder, de comando, da figura masculina. Ainda o mito do poder está na masculinidade. A conhecida objetividade masculina, ainda reina na concepção leiga que está relacionada ao comando ministerial pastoral. O sucesso eclesial das igrejas locais ainda está ligado ao sacerdócio veterotestamentário. 2. O “espírito histórico” precisa ser compreendido. É necessário manter a tradição e não o tradicionalismo. O espírito dos implantadores do protestantismo no Brasil trouxe uma mensagem de mudanças e não de mordaças. Os pioneiros batistas brasileiros participaram das mudanças estruturais do Brasil. Pode-se discordar de alguns posicionamentos teológicos destes pioneiros, mas não se pode negar o papel fundamental das mudanças no mundo social, religioso, político, cultural que a implantação protestante impôs. Eles ajudaram a mudar as estruturas políticas e sociais do país. Mesmo sabendo que o texto bíblico ensinava que “Toda autoridade é dada por Deus”, entenderam que havia a necessidade de mudança de autoridade. Eles entenderam que ser conservador não era conserva-dor. A libertação de preconceitos estruturais que afligiam a nação precisava acontecer. Era preciso trazer as mudanças que continham as marcas do Reino de Deus e traziam a graça divina a nação. Entendiam que Deus fazia chover sobre justos e injustos. A graça comum era para todos. Esta era a dinâmica da história. Trazer mudanças que beneficiem as pessoas. As estruturas estavam ao serviço do ser humano e não vice versa. Era o exemplo de Jesus. Portanto, hoje, o mesmo espírito deve ser invocado quando pensamos no ministério pastoral feminino. 3. Existe uma visão ministerial baseada numa compreensão mono cultural-religiosa da vida cristã. O mundo objetivo dos homens não permite a força da subjetividade feminina. Não se entende que o homem não possui subjetividade ou a mulher não tenha objetividade, mas hodiernamente, é reconhecido que a intuição feminina é uma marca peculiar das mulheres. Nas últimas décadas a intuição tem sido confirmada como fonte de conhecimento e ação. O monoculturalismo religioso que marca a teologia batista tem sido questionado nas últimas décadas. O clímax deste questionamento acontece atualmente com o surgimento do ministério pastoral feminino. Embora incipientemente, começou a ser entendido que a mulher também sabe liderar, fazer teologia e agora pastorear. A vida, a teologia, o poder, a autoridade precisam ser entendidos dentro da “cultura feminina” para que a compreensão do evangelho da graça de Deus e o entendimento da “imagem e semelhança de Deus” no ser humano estejam completos. Isso não é liberação feminina, mas expressão da graça. É o entendimento do complexo mundo do poder. Ele possui objetividade e subjetividade. Ele é feminino e masculino. O poder não é comandar, é influenciar. 4. O impedimento ao ministério feminino pastoral tem raízes históricas eclesiásticas. Os pioneiros batistas que chegaram ao Brasil traziam no seu bojo teológico eclesiológico as marcas do landmarkismo. Esta linha de pensamento reconhecia como pastores ou ministros da palavra somente aqueles que tinham sido batizados e ordenados por outros pastores batistas. Desta forma criava-se uma “sucessão pastoral” que preservava a “sã doutrina” dos batistas. No conceito doutrinário do movimento, igrejas que não possuíam esta marca “sucessória” não eram consideradas igrejas de Cristo e a linha sucessória pastoral é masculina. Outras denominações evangélicas já tinham nos seus quadros líderes do sexo feminino. Pregadores que não se enquadravam nesta marca não eram convidados a usar os púlpitos batistas ou participarem da Ceia do Senhor. 5. O quinto questionamento que deve ser levantado pode ser chamado de “crise sacramental”. Deve-se perguntar: O pastorado é um sacramento? Diante do fato que a mulher pode exercitar todas as áreas dos ministérios eclesiais, por que ela não poderia ser ordenada ao ministério pastoral? Qual é o significado da “oração consagratória”; quando alguns “pastores homens” impõem as mãos sobre outro homem? Existe uma “transmissão de poder”? Estaria inserida nesta oração a idéia metafísica de que “algo acontece no céu”? Teologicamente, existiria o pensamento que existe é que coisas acontecem no chamado “mundo espiritual” que devem ser concretizadas na terra? Existem ainda outros pontos que podem ser levantados. No momento a denominação batista, com mais de um século no Brasil, deve despertar o pioneirismo dos seus missionários. Isso se faz analisando a história, o momento que se vive e acima de tudo, pelo fato de que o Espírito sopra onde quer, pois onde o Espírito do Senhor está, há liberdade. O fenômeno do ministério pastoral feminino precisa ser estudado com maior afinco e com os recursos das ciências bíblicas e antropossociais para fazermos uma leitura do mundo contemporâneo. Não é viável cristalizar doutrinas de homens, práticas tradicionalistas, que inviabilizam a pregação do evangelho. Não se trata de uma guerra dos sexos, mas de um dialogo cristão acima do poder e sem preconceitos tanto dos homens e das mulheres. “... à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” Genesis:1:27
JOTAEME